Compliance bancário: fazer o certo é o único caminho para as instituições no País

A partir da entrada em vigor da lei 12.846/2013 (chamada ‘lei anticorrupção’) a palavra compliance (conformidade) foi inserida definitivamente no vocabulário corporativo brasileiro.
Isto porque o artigo 7.º da referida lei, ao tratar da aplicação das sanções administrativas e judiciais previstas naquele diploma em relação às pessoas jurídicas, expressamente previu em seu inciso VIII que serão levados em consideração pelo julgador: ‘a existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica’.

 E ao conjunto de mecanismos e procedimentos voltados à proteção da integridade e da ética da empresa, com o incentivo institucional à denúncia de irregularidades para apuração e punição, dá-se o nome de compliance. Porém, o conceito do que podemos chamar de uma ‘cultura de compliance’ não é novo entre nós.
No Brasil, desde 1998, com a publicação da Resolução 2.554 do Conselho Monetário Nacional, incorporaram-se as regras trazidas da Europa e dos Estados Unidos da América que continham a filosofia compliance para nosso mercado financeiro.
Nos EUA, a SEC – Securities and Exchange Commission – criada em 1934, e que equivale à nossa CVM, preocupa-se desde a crise de 1929 com a proteção do mercado de valores mobiliários e seus investidores.
Na Europa, houve em 1975 a primeira reunião do Comitê da Basiléia para Supervisão Bancária, fórum integrado ao BIS – Bank for International Settlements, organização internacional criada ainda em 1930.
A missão do BIS é dar suporte aos bancos centrais na busca pela estabilidade monetária financeira de seus países membros, fomentar a cooperação internacional nessas áreas e atuar como um banco para referidos bancos centrais.
Ambos (BIS e seu Comitê da Basiléia) estão sediados na cidade suíça que dá o nome ao Comitê, sendo que tal Comitê tem o fim prover um fórum de cooperação entre os bancos centrais dos países membros, supervisionando e regulamentando a atividade bancária internacional, com o fim de se aumentar a estabilidade financeira (inclusive com o fim de evitar a lavagem de dinheiro).
Em setembro de 1997 o Comitê lançou vinte e cinco princípios para uma ‘supervisão bancária eficaz’ (Core Principles for Effective Banking Supervision), merecendo especial importância o princípio n. 14, que trouxe expressamente a necessidade da existência da função, apropriada e independente, da figura do compliance.
Aqui foi publicada a lei 9.613 em 04/03/1998, conhecida como a lei de combate aos crimes de ‘lavagem’ de dinheiro. E é na referida lei 9.613/98 (criadora do COAF) e nos princípios do Comitê da Basiléia que podemos encontrar a gênese da Resolução 2.554/98 do Banco Central, de 24 de setembro de 1998.
Desnecessário dizer que juntas, a lei 9.613/98, respeitando os princípios do Comitê da Basiléia, e a Resolução do Banco Central do Brasil em tela, representaram então verdadeiro divisor de águas em nosso ordenamento jurídico bancário, sendo que após suas publicações toda atividade normativa brasileira no segmento passou a ter que considerar tanto a busca pelo combate aos crimes de lavagem de dinheiro quanto o fomento por sistemas de controles internos efetivos nas “instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil” (art. 1º da Resolução).
A grande novidade trazida pela lei anticorrupção, é bom que se diga, são os benefícios que podem ser obtidos com a implementação daquela cultura ética e de controles internos no âmbito da empresa.
Quanto mais ética e em conformidade às leis e regulamentos estiver de fato a empresa (com efetivo programa de controles internos e compliance), menor deverá ser a sanção a ela imposta no caso do cometimento de eventual infração, apesar dos ditos controles.
O cenário legislativo pós 2014 (data da vigência da lei anticorrupção) trouxe, portanto, benefícios reais ao se ter uma área de compliance devidamente estruturada na empresa (não só no ramo financeiro), com o fim de se poder obter uma sanção – eventualmente aplicada – em patamares menores que normalmente o seriam se a empresa não cumprisse aquela ética cultural de compliance.
Recentemente, em 2017, o Conselho Monetário Nacional editou a Resolução 4.595, ato que veio tratar da “política de conformidade (compliance)” das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil. Essa norma tem o grande mérito, na realidade, de reunir vários temas de compliance bancário – muitos deles até já conhecidos e aplicados – em um único documento.
Finalmente, e como colocado na obra ‘Compliance Bancário – Um Manual Descomplicado’, Editora Quartier Latin, escrito em coautoria com o Procurador Regional da República Carlos Fernando dos Santos Lima, atualmente o Brasil, antes dependente dos ensinamentos e das regras importadas dos EUA e da Europa, ‘já se encontra em posição de vanguarda no que diz respeito ao compliance bancário’.
E a alta administração dos bancos parece já ter percebido que o ‘fazer o certo’ é o único caminho para a manutenção dos negócios da instituição.
Fonte: Estadão