Blindagem patrimonial: visão realista de uma prática perigosa

Por Izabela Rücker Curi Bertoncello
Muito comum na hora de tentar proteger o patrimônio de pessoas físicas envolvidas em questões societárias, a blindagem patrimonial, apesar de amplamente difundida, é uma prática que esconde diversos perigos em suas camadas jurídicas. Diferentemente do conceito de proteção patrimonial, que tem caráter preventivo, a blindagem geralmente acontece quando já há algum problema de ordem financeira em andamento. Por isso, não possui respaldo garantido pelas leis brasileiras e, geralmente, têm por objetivo esconder bens e informações para evitar que seus proprietários ou detentores respondam por dívidas atuais ou futuras.
Se a empresa ou a pessoa física forem titulares de dívidas e a organização patrimonial resultar em esvaziamento do patrimônio dos devedores, isso poderá ser visto como fraude a credores. As consequências jurídicas são drásticas porque geram disputa judicial, custos, nulidade de atos praticados e direito à indenização da cadeia de prejudicados. Nesses casos, sempre há mais de um desfavorecido pela transferência de bens por quem é devedor, já que pode demorar a ser reconhecida uma fraude e o bem envolvido já pode ter passado por diversas titularidades.
Em contrapartida, quando o objetivo é ordenar a organização societária e/ou patrimonial, realizada com o propósito de facilitar a sucessão familiar; sucessão empresarial; governança corporativa; gestão lícita de tributos, administração de investimentos, bens e empresa, o cenário muda.
A isso denominamos estratégia de organização da gestão jurídica patrimonial. Inicialmente, essa organização gera um custo com despesas perante órgãos públicos e demais providências, que variam de caso a caso, mas promovem economia tributária, de risco trabalhista, societário e comercial que podem chegar a até 30% num período prolongado de análise.
 

Como adequar a estratégia da empresa para prevenir danos?

A formação de Holdings tornou-se um método popular. Todavia, mostrou-se ineficiente porque engessa a entrada e saída de sócios e os investimentos por meio de emissão de debêntures (títulos que permitem que terceiros não sócios invistam no negócio em troca de rendimentos futuros).  Além disso, em vários municípios não se gera mais a isenção do imposto de transmissão para que bens possam ser agregados ao capital social das empresas e, também, há o risco de exposição dos balanços das organizações em virtude da fiscalização dos órgãos públicos sobre essa manobra jurídica.
Por isso, a estratégia mais adequada é aquela definida caso a caso entre o interessado, seus sócios e os profissionais que o assessorarão. É preciso levar em conta se as empresas são familiares ou não; se já contam ou não com compliance e governança corporativa; qual a natureza dos bens em questão; se há dividas a saldar; regime de caixa das empresas; regularidade fiscal e demais leis.
Mesmo que as empresas não estejam com todos os fatores acima presentes ou regularizados, é possível realizar a estruturação relativamente rápido e sem grandes traumas ou incômodos. Mas, é importante que os sócios ou familiares estejam engajados no projeto e dispostos a realizarem algumas concessões mútuas e mudanças.
Algumas vezes, essas mudanças são mais difíceis sob o ponto de vista psicológico dos envolvidos, pois é da natureza do ser humano tender a não sair de sua zona de conforto. É neste momento que conflitos podem vir à tona. Por isso, recomendamos fortemente que as empresas e famílias sejam assessoradas por profissionais capacitados também em técnicas de negociação e mediação. Esse será um diferencial efetivo para não paralisar o fluxo de mudanças necessárias ao processo de organização da gestão jurídica patrimonial.
 

Blindagem pode ser “quebrada”?

Pode! E é importante ressaltar que a descoberta de tentativas de blindagem patrimonial pode ser bem rápida a partir do momento em que os credores solicitem a investigação e análise de dados. Processos de “quebra” de blindagem patrimonial geralmente acontecem mediante busca de dados, bens e informações em diversos sistemas desenvolvidos para isso e alimentados por dados públicos e acessíveis a todos. O que esses sistemas proporcionam é a análise e cruzamento inteligente de informações, possibilitando que sejam descobertos os mais diversos métodos destinados a tentativa de esconder bens e dados.