O tempo médio de espera entre o pedido e a concessão de uma patente no Brasil está em torno de dez anos. Isso não é aceitável, diante do ritmo acelerado da inovação que move a economia atual. A média de dez anos para conceder uma patente contrasta com a realidade dos principais países do mundo, nos quais os prazos giram em torno de três anos. Um dos principais gargalos desse processo no país é o volume acumulado de solicitações. Conhecido como backlog, o número de pedidos de patentes aguardando exame no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) está em torno de 230 mil. O backlog, desproporcional ao número de examinadores do Inpi, é a principal causa desse problema.
A atual gestão do Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços [MDIC], ao qual está subordinado o INPI, não ignora o problema do número de examinadores. Ao contrário, vem implementando um plano de melhorias na gestão do instituto. Desde o ano passado, o INPI recebeu 210 novos servidores que trabalham com patentes e com marcas. Foram tomadas diversas providências administrativas que colaboram para a melhoria da performance. Como resultado, o INPI já apresenta expressivos ganhos de produtividade nas análises de patentes.
Entretanto, a atual capacidade operacional do Inpi não é suficiente para reduzir o backlog. Assim, as projeções mais otimistas, a partir de ganhos incrementais de produtividade e gestão, levam apenas à redução do ritmo de crescimento do backlog de patentes, e não à sua solução. Isso revela que, sem uma solução enérgica para o problema, jamais será possível alçar o INPI às melhores práticas internacionais.
O Brasil não é o único país a ter de enfrentar, ao longo de sua história, a questão do grande backlog de patentes. Outros países passaram por situações similares e tomaram medidas cabíveis, dentro dos próprios contextos, como a contratação temporária de examinadores ou a terceirização da análise dos pedidos. Entretanto, a legislação brasileira dificulta, e em alguns casos até impede, o prosseguimento desses caminhos. O atual imperativo da consolidação das contas públicas no país reforça a necessidade de buscar alternativas baratas, ou de custo compartilhado, enquanto a própria natureza do problema, de contínuo acúmulo, exige uma implementação rápida.
Por isso, MDIC e INPI consideram uma solução inédita, de deferimento simplificado de todas as patentes do backlog, enquanto oferece ao mercado salvaguardas para identificar e interpor oposição a patentes indevidas ou solicitar exame completo em casos específicos [nota da redação: a patente se destina a proteger temporariamente o indivíduo ou organização inovador contra as cópias da concorrência. Daí a importância de evitar que essa proteção seja dada indevidamente]. Que fique claro, essa medida exclui por completo o setor farmacêutico. A concessão de patentes para produtos e processos farmacêuticos seguirá o trâmite usual de análise.
A proposta está em consulta pública desde 31 de julho, e a sociedade tem até o dia 21 de agosto para fazer considerações sobre o texto da norma. A proposta de procedimento simplificado de deferimento de patente é uma medida temporária, facultativa e excepcional. Temporária porque apenas os pedidos já depositados até determinada data serão passíveis de se beneficiar do deferimento pretendido. Facultativa porque o depositante pode excluir seu pedido do procedimento simplificado, mediante petição – prerrogativa que também pode ser exercida por qualquer interessado que pode, com a apresentação de subsídios, excluir pedidos de terceiros do procedimento simplificado, reduzindo, assim, os riscos de uma eventual proteção indevida. Excepcional porque o governo brasileiro não pretende reeditar essa solução, uma vez que entende que os resultados, junto com outras medidas, serão estruturantes e vão colaborar para a normalização do fluxo de análises de patentes no país.
É importante ressaltar ainda que patentes concedidas mediante o procedimento simplificado, que eventualmente afetem terceiros, são passíveis de revisão administrativa e judicial. Quanto ao reflexo da medida na economia, deve-se ressaltar que a maior parte dos pedidos a serem mantidos no procedimento simplificado terá efeito limitado sobre o nível de concorrência no mercado, de acordo com estudos prévios realizados pelo INPI [nota da redação: o sistema de patentes, idealmente, não deveria proteger quem não faz inovação real. A proteção indevida ou excessiva atrapalha a concorrência e, assim, prejudica o consumidor].
A norma proposta se insere em um conjunto de medidas em negociação no governo federal, que também inclui, por exemplo, a realização de novo concurso público para a contratação de mais examinadores para atender à demanda corrente de pedidos. Reforços na infraestrutura do INPI e na área de tecnologia da informação também estão sendo negociados. Sem esse pacote de medidas, a aprovação da norma reduzirá o backlog, mas não trará uma solução perene para o serviço de análise e concessão de patentes no Brasil.
Não se pretende impor o procedimento simplificado, mas promover uma discussão sobre soluções pragmáticas e viáveis. O envolvimento da sociedade nessa iniciativa é fundamental. Por isso, além de conversas permanentes com o setor privado, a consulta pública é um instrumento transparente, cujo objetivo é aprimorar a proposta de solução do backlog. O procedimento simplificado de deferimento de pedidos de patentes não é o caminho mais confortável, mas é o possível dentro das condições de nosso contexto atual. Trata-se de uma medida, em conjunto com outras, de baixo custo, passível de resolver um problema histórico.
O sistema nacional de propriedade industrial já sofreu todas as consequências da deterioração da capacidade de resposta do Estado brasileiro. Mas, hoje, temos a oportunidade de virar a página e começar uma nova história para o ecossistema de inovação do país. Essa é a nossa intenção, colaborar para a melhoria efetiva do ambiente de negócios brasileiro, incentivar o desenvolvimento dos setores inovadores e entregar um sistema mais célere e seguro de análises de patentes para as nossas empresas e investidores estrangeiros. Se formos bem-sucedidos, isso resultará também em mais e melhores empregos no país.
Fonte: Época